A cidade de Belém do Pará sediará este ano a 30ª edição da Conferência das Partes (COP30), o maior fórum global das Nações Unidas sobre mudanças climáticas. Belém do Pará é uma metrópole vibrante com quase 1,5 milhão de habitantes na região amazônica do Brasil. O papel socioambiental que o bioma amazônico desempenha vai muito além do Brasil (que abriga 60% dele). Ele representa mais da metade das florestas tropicais remanescentes do nosso planeta, compreendendo sua maior biodiversidade.
A região norte do Brasil, onde estão localizados Belém do Pará e o bioma amazônico brasileiro, tem a pior conectividade entre as cinco regiões do Brasil, com 19% de sua população sem acesso à internet. Entre aqueles que estão conectados, 89% não têm conectividade significativa, ou seja, adequada, sustentável e alinhada com seus projetos e necessidades. Uma infraestrutura digital que poderia ajudar a preservar a riqueza ecológica dessa região e apoiar as comunidades locais continua praticamente inexistente, tornando a inclusão digital um desafio crítico e destacando o potencial das iniciativas de conectividade centradas na comunidade (CCCIs).
A iniciativa Redes Locais (LocNet, pela sua sigla em inglês) traz as CCCIs para o debate sobre conectividade no contexto da justiça socioambiental, destacando o papel proeminente que elas desempenham. Embora a conectividade possa ajudar na proteção socioambiental e desempenhe um papel central na viabilização de processos de denúncia de violações dos direitos humanos e ambientais, a conectividade tradicional é frequentemente marcada por seu impacto socioambiental negativo, mantendo sua infraestrutura por meio da mineração ilegal na produção de componentes para dispositivos, uso extensivo de recursos naturais para alimentar centros de dados e poluição generalizada.
A conectividade também apresenta riscos para os usuários. Como ferramenta de comunicação, ela pode expor territórios e seus defensores, tornando-os vulneráveis à disseminação de desinformação, à manipulação do debate público e da democracia e até mesmo ao recrutamento e proteção de perpetradores de crimes ambientais, como os mencionados acima. A questão é se a conectividade centrada na comunidade pode mudar o equilíbrio – fazendo com que a conectividade sirva à justiça ambiental e, ao mesmo tempo, possibilite atividades econômicas justas e específicas para o contexto daqueles que vivem na Amazônia.
A LocNet distingue as CCCIs das operadoras e infraestruturas tradicionais através de um conjunto de princípios fundamentais que ajudam a orientar o trabalho [include link to principles here], incluindo valores como o foco na comunidade, a participação e o fortalecimento do bem-estar da comunidade. A iniciativa também prevê princípios ambiciosos, um dos quais é a consciência ambiental:
“Projetar a infraestrutura ou os serviços de forma a contribuir para a preservação do meio ambiente e da biodiversidade do território, e com cuidado com as comunidades desses territórios.”
Esses princípios também estão alinhados com a carta de autoafirmação das Redes Comunitárias no Brasil, revisada em outubro de 2024 [include link to letter here], que afirma que os membros do “Comitê Nacional de Redes Comunitárias” compartilham a carta para, entre outros objetivos:
• Expressar valores fundamentais que nos unem em nossa diversidade, como autonomia, bom viver, preservação dos biomas, colaboração, empatia, alianças entre lutas sociais e defesa dos territórios. Além disso, apropriação comunitária das tecnologias sociais e livres de informação e comunicação, valorização dos modos de vida e do conhecimento local e existência multicultural dos brasileiros.
• Defender a autonomia digital em diálogo com a preservação dos biomas.
Na COP30, pretendemos aprender com os atores e movimentos socioambientais locais sobre como a conectividade molda suas realidades e apoiar práticas tecnológicas que aprimorem seu trabalho. Portanto, aproveitamos esta oportunidade para embarcar em uma jornada para identificar como os princípios estruturais da iniciativas de conectividade centrada em comunidades e os da justiça socioambiental se alinham e se complementam.
Nesse sentido, estamos iniciando uma série de atividades para estabelecer conexões entre as agendas de inclusão digital e justiça ambiental, a partir das experiências das comunidades locais. Para isso, convidamos Thiane Neves, do Instituto Perpetuar e da Rede Transfeminista de Cuidado Digital, e Juliana Albuquerque e Ray Baniwá, comunicadores da Rede Wayuri, para destacar juntos a agenda de conectividade da COP30 [include link to letter here] e compartilhar reflexões e conteúdos deste evento, da Cúpula dos Povos e de outros espaços comunitários focados na justiça ambiental que estão sendo realizados durante novembro de 2025 em Belém do Pará.
Para dar início a essa colaboração, começamos com as reflexões de Thiane sobre esse evento global que está ocorrendo em sua cidade natal, explorando o que a COP30 significa localmente para a conectividade, infraestrutura, racismo e justiça socioambiental.
Ao longo da COP30, esse espaço colaborativo será alimentado pela cobertura multimídia da Rede Wayuri, compartilhada em plataformas de mídia social, incluindo LinkedIn, Instagram, Mastodon, Facebook and Bluesky. Essa cobertura destacará as vozes da comunidade e as perspectivas locais que muitas vezes faltam nas discussões globais sobre o clima.
Como parte desse esforço, também estamos compartilhando um conjunto de manuais práticos desenvolvidos pelas Comunidades de Prática da LocNet. Esses guias mostram como as CCCIs podem se alinhar às melhores práticas socioambientais, incluindo o uso de energia fotovoltaica, técnicas de construção com bambu, economias circulares e moedas comunitárias – demonstrando que a conectividade sustentável é possível e replicável.
Esses primeiros passos marcam o início de uma jornada para fortalecer as conexões entre inclusão digital e justiça ambiental. Ao centralizar as vozes e experiências da comunidade, nosso objetivo é ampliar o impacto positivo que uma conectividade significativa pode proporcionar – capacitando as comunidades a defender seus territórios e, ao mesmo tempo, protegendo-as dos danos potenciais que a conectividade poderia trazer. A conectividade centrada na comunidade concentra seus objetivos no cuidado com a justiça ambiental, demonstrando que outra forma de conectividade é possível: uma que sirva tanto às pessoas quanto ao planeta.



